Talvez "as pequenas pausas entre nós e as palavras", como muito bem disse Pedro Oom, me façam duvidar da concretização da vida. Tento pensar assim, é mais fácil e vou criando as redomas necessárias para aguentar o facto de não dormir (e de aguentar só por aguentar). Se, por um lado, a poesia nada tem que ver com os sentimentos comuns e nada pode ter a ver com o estabelecido (antes com o penetrante), por outro, o "pão para a boca" do Luiz Pacheco faz também todo o sentido. Vem isto a propósito de quase tudo o que (não) tenho feito até hoje. Dizem-me que isto (que passarei a explicar) é inevitável em qualquer tempo. Dizem-me que nem todos temos a capacidade de reunir, acolher ou praticar do melhor modo as sortes da vida. Cheguei a pensar que estava a ser franco comigo próprio. Cheguei a pensar, mesmo, que apenas vivia no medo de viver nos opostos da realidade. Mas não! A condenação é bem mais trágica: sou um incapaz. Caminho, hoje, para a 5ª (ou 6ª?) ocupação profissional (sem contar com part-times e ocupações de verão) desde que acabei o curso. O único, diga-se, que poderia ter feito. A coisa, mais derrocada menos derrocada, foi feita com razoável engenho. Seguiu-se uma tese de mestrado agarrada ao mais íntimo de mim. A coisa foi elogiada e penso que em breve poderei tirar alguns dividendos (lá está, o pão para a boca) da iniciativa. Mas voltando ao cerne. A verdade é que tenho uma absoluta inércia perante o mundo que me (nos?) é proposto. Não sou infeliz, sou incapaz. Não sou infeliz porque este não é o meu mundo. Talvez seja isso. Mas e o pão? O pão, senhores? É abjecto, o pão? Não, não é. O pão é o resultado da organização social das coisas, é certo, mas pode ser também via de acesso à alegria. Ou se calhar não. Se calhar é esse mesmo pão que nos leva a constantes desencontros com o desejado, com a felicidade. Dizem-me que posso sempre aprender, toda a gente aprendeu e que iremos continuar a aprender as condições necessárias para vivermos. Como se viver tivesse que ser o mínimo fôlego de felicidade, um recesso de vontade num mar de insuficiências. E não encaixo neste mundo real, no autêntico que descubro. Talvez o que quero ("viver poeticamente") seja impossível, irreal, mesmo inumano. Talvez, não! É. Certamente. Sinto-o. Na folga cada vez mais apertada dos laços e dos nós agarrados ao meu destino.
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4 comentários:
Pudessemos ser mais que a carne. Pudessemos. Decalcava as tuas palavras.
"Como se viver tivesse que ser o mínimo fôlego de felicidade, um recesso de vontade num mar de insuficiências."
Aquilo que eu acho e pondo de parte o facto de te conhecer há muito tempo é que ninguém que escreve aquilo tem "laços e nós" agarrados ao destino. Apenas os que quiser ter. percebes?
Eu não sou nada bom a memorizar o que os poetas dizem. Tipo o Sócrates (o nosso) aquando daquela entrevista em que só lhe faltou declamar Camões... :-) De qualquer modo, um dos poucos versos que sei de cor é do Pessoa (e vê lá que nem sei "qual" deles é):
"Sou lúcido! Merda, sou lúcido...!"
E dói! Porque, honestamente, queria ser feliz (mesmo de uma felicidade enganada, mas que interessa se eu também não o saberia) com shoppings ao Domingo, dinheiro na carteira, cinemas à 2ªf, namoradas consentidas, roupas nas peles morenas. Mas, na verdade, não sou. Sou um escravo deste futuro antigo que desenho para mim. Acho que é isto.
P.S.- Vou ler o teu livro em breve. E, depois, falarei dele aqui. Ainda só li a(s) dedicatória(s). :-)
"Cheguei a pensar, mesmo, que apenas vivia no medo de viver nos opostos da realidade."
e ainda bem que vives!
MA
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