terça-feira, outubro 09, 2007

O meu avô é mais do que o pai da minha mãe

Numa memória de escuridão o teu corpo é o lugar do medo onde choram muitas gargantas por terem perdido tudo choram a voz profunda e negra do fundo da terra. Todos os dias carregas nos olhos o crepúsculo que nos inunda de dor e no sofrimento do mundo fico a receber a raiva de silenciosas explosões no céu. Por entre o ruído mecânico de pessoas amontoadas nos meus olhos os teus silêncios são ainda a voz tranquila de quando o meu corpo cabia no teu colo. Uma esperança antiga procurada na escuridão como quando fecho os olhos e te vejo sem me faltares como quando fecho muito os olhos e vejo em ti o meu rosto verdadeiro rosto que os espelhos nunca me contaram como quando fecho muito muito olhos na esperança de não te ter perdido e de já não seres permanente ausência em todos os meus dias como quando fecho muito muito muito os olhos e penso em mim e te vejo ainda sem noites de pesadelos e sem as dores com o tamanho de muitos anos com o tamanho de todos os tempos. Dias em que o único som é o teu olhar calado as tuas mãos baralhadas e desocupadas o teu corpo a escorregar dos ossos e em que te pousas sobre os meus braços estendidos ao teu desespero de milhões de homens mutilados. E hoje percebo que não se fazem pedidos à vida sei que o silêncio todo do mundo te ocupa de sombras a memória numa agonia lenta que se repete nas coisas que pensas fazer com as tuas mãos sempre vazias. Na tua solidão a minha tristeza como quando o mundo era apenas tudo aquilo que parecia não separar as nossas vidas quando brincávamos na praia no jardim na rua ou na sala entre os candeeiros compridos como quando o mundo era partilhado e o significado das palavras era um segredo só nosso como quando o teu sorriso era os teus lábios e eu rodeado dos risos de criança que me ensinaste a perceber como quando apontavas no céu o voo dos pássaros para lá das janelas sob uma sombra fresca e dócil do embalar dos teus braços. Eras assim gesto gentil em tudo que me ensinou que é possível estarmos juntos mesmo depois de nos separarmos como se a minha vida se prolongasse pela imensidão do céu no vazio que existe depois de ti. Sei o que é um amor a existir muito para além de todas as perguntas maior do que o mais fundo segredo como aprender a caminhar em silêncio com os nossos passos porque és uma voz dentro de mim enterrada em tudo o que faço e sou onde tenho a crescer como uma planta regada pela luz da tua voz doce todo o medo e todo o amor a dizer-me que não me vais abandonar nunca e que posso dizer a toda a gente mesmo no fim absoluto de toda a esperança que entreguei a minha vida a quem sempre me quis.

2 comentários:

Ninguém disse...

Acho que já é possível comentar...Só que, para isso, é necessário clicar no título do post e aí sim, aparecem as opções... Que raio de blog, foi mesmo saír à dona, cheio de truques!!!beijinhos e, mais uma vez, belo texto...

Anónimo disse...

ó tozé monhé tu até escreves bué, né?